sábado, 9 de abril de 2011

Cantigas de mendigos

As cantigas de mendigos ou cantos de pedintes, a exemplo dos pregões, visam não a uma regularização ou acréscimo da atividade do trabalhador, mas à obtenção de um resultado que se deseja conseguir de outrem.
Os cantos de pedintes mais característicos são os dos cegos de rua. Monótonos e tristonhos, constituem uma tradição portuguesa.

Nas feiras nordestinas ainda se conserva vivo o costume dos cegos pedintes. Alguns tocam instrumentos, outros cantam em dueto ou isoladamente, pedindo esmolas numa súplica plangente e anasalada.

Alguns exemplos recolhidos pelo folclorista Rossini Tavares de Lima, publicado em Abecê do folclore (4ª edição, São Paulo, Ricordi, 1968, p.206):

"Esta cantiga era entoada por um anão que pedia esmolas nas ruas de Monte Santo, Minas Gerais, na década de 1910". Informante: Romeu Médici (dentista)":

Deus lhe pague a boa esmola
Deus lhe pague a boa esmola
Dada de boa vontade
Dada de boa vontade

Lá no céu tereis o pago
Lá no céu tereis o pago
Da Santíssima Trindade
Da Santíssima Trindade

"Esta marcha era cantada durante a década de 1920, em Pereiras (São Paulo), por três cegos que a denominavam 'Vida de pobre'". O registro é de 1952 e a informante foi Francisca Vaz de Almeida":

O rico dorme no "corsão" de pena
Coitado pobre no gelar do chão
O rico acorda tem sua mesa ao lado
Coitado pobre mendigando o pão

O pobre sai de porta em porta
Pedindo esmola pelo amor de Deus
O rico nega e lhe dá as costas
Coitado pobre sai do destino seu

Os ricos fazem os seus teatros
Tudo para ele se parecem bem
Coitado pobre com sua bolsa ao lado
Sua bolsa escassa nem sequer vintém

O rico morre tem seu cimento armado
Missa canta com Te Deum
Coitado pobre apenas tem mortalha
Sua alma salva para entrar no céu


"Esta solfa, em tempo de marcha, cantada por uma cega de Pereiras (São Paulo), em 1952, foi recolhida por um ex-aluno":

Sou ceguinha de nascência
Isso assim não é viver
Minha dor é grande e imensa
Quem me dera eu morrer

Porque assim fui condenada
Se nunca fiz mal a ninguém
Viver em trevas sepultada
Não conheço nem pai e nem mãe

Devem ser lindas as estrelas
E que as serras é oval
Eu só conheço as andorinhas
Pelo riso seu de cristal

Que são lindas as andorinhas
Que sempre escuto a cantar
Eu que vivo triste sozinha
Por não poder enxergar

Devem ser lindas as estrelas
A aurora linda é
Dava tudo para vê-la
E a minha própria vida até

Sou ceguinha de nascência
Nesta imensa escuridão
Espero um dia que um anjo
Venha me dar a sua mão


"Este tema era entoado por um velho cego que acompanhava-se com um chocalho, pela rua do Norte, em Vitória (Espírito Santo), entre 1942 e 1945. Informante: Leny Gonçalves":

Uma esmolinha pro cego
Peço por favô me dá
Eu não vejo a luz do dia
Quero nas trevas sonhá


Fontes: Enciclopédia da Música Brasileira - Art Editora; Jangada Brasil - Realejo.

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