terça-feira, 10 de maio de 2011

Cururu

Grupo entoando o Cururu
O cururu é uma dança com canto em desafio, ligada às festas religiosas populares existentes em São Paulo, Mato Grosso e Goiás. Em tupi-guarani (kururu), a palavra designa um tipo de sapo grande.
Para Mário de Andrade, trata-se de dança ameríndia incorporada pelos jesuítas às festas religiosas realizadas fora ou dentro do templo. João Chiarini rejeita a hipótese, afirmando ser o cururu “cantoria luso-afro-brasileira”.


Foi registrada pela primeira vez, ao que parece, pelo etnólogo alemão Karl von den Steinen (1855—1929), em Cuiabá MT, em 1887. Outro etnólogo, Max Schmídt (1874—1950), presenciou a dança a 31 de dezembro de 1900, na cidade de Rosário, MT. É dança de roda, sem palmas e sem sapateado, com acompanhamento de violas, rabecas e reco-recos e com desafios. Quando é programado numa festa, com cantadores de fora e demais convidados, é de bom-tom que o dono da casa forme a dança, aproxime os cururueiros, apele para seus dotes de cantadores e improvisadores.

Geralmente consta de três partes: louvação, bateção (batição) e perguntação.

1) Louvação é o ato de louvar o santo padroeiro da festa, motivo da reunião, ou os donos da casa, um convidado de honra. Louvação é também fecho para se encerrarem os desafios ou bateção.

2) Bate ção é o ato de se porem defeitos, criticar, bater em um dos presentes, procurando ridicularizá-lo. Geralmente vem a ser um desafio.

3) Perguntação é modalidade de desafio entre dois cantadores ou, sem dasafio, pergunta feita para qualquer cantador da roda responder. A cantoria é toda feita em quadrinhas tradicionais. Como principal centro da dança em Mato Grosso é apontada a cidade de Poconé, além da capital e Barra dos Bugres. Pelo menos nessa cidades o cururu é dançado em roda, que gira no sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. 

Somente quem começou a cantar a trova é que poderá mudar a rima. Como introdução, canta-se o baixão, como por exemplo la!, lai, lai, la!. A seguir o cantador e o ajudante (ou segunda) interpretam o sentimento religioso. Depois começa a porfia ou desafio. Na porfia, não se pode cantar mais do que uma quadra e meia. Em geral, porém, são quadrinhas apenas. Durante a cantoria, a roda vai girando e os participantes fazem, às vezes, trejeitos. Mulher não dança o cururu e é censurada se o faz.

Em Mato Grosso são estes os instrumentos acompanhadores: cotcho, dois adufes, três ganzás. Um levantamento realizado por Rossini Tavares de Lima em Tietê, Laranjal Paulista, Conchas e Pereiras permitiu estabelecer a estrutura do cururu no Estado de São Paulo. 

1) Origem do nome e da dança. Segundo um cururueiro piracicabano, o nome se deve ao fato de o cururu lembrar uma dança de sapo, porque os dançadores dão pulos como os dos sapos-cururus. Por outro lado, cururu seria nome local da dança-de-são-gonçalo. 

2) Local da função e disposição dos dançadores. Em São Paulo a dança é ou era tradicionalmente realizada defronte a altares de igrejas católicas. Mais recentemente, tem sido apresentada ao ar livre, durante festas públicas ou em estações de rádio, teatros, barracões, Os participantes dispõem- se em duas filas diante do altar, cada uma tendo à frente, respectivamente, o pedreste (violeiro principal) e seu segunda. Este, cantando em terças acima ou abaixo, faz dueto com o instrumentista. As fileiras são formadas alternando-se um instrumentista e um canturião (cantador), mais ou menos nesta ordem: segunda — primeiro canturião; violeiro — segundo canturião; recorequista — terceiro canturião; pandeirista — quarto canturião; tocador de puíta — quinto canturião; e assim sucessivamente. Essa ordem não é rígida: o que realmente importa é cada canturião, no momento de jogar os versos, estar sempre entre o seu segunda e o violeiro. Para começar a dança, o pedreste “tira a licença” ou “faz a louvação” aos santos do altar e depois ao dono da casa. Durante essa introdução, os cururueiros podem ou não movimentar-se. A movimentação mais comum consiste na fila do violeiro sair pela direita e a do segunda pela esquerda, efetuando pequenos círculos. Todos os participantes, inclusive o violeiro e o segunda, fazem menção de se ajoelharem e beijarem o altar. Concluída a introdução, ovioleiro avisa que vãoarrudiá (arrodear), seja, fazer a roda. Esse movimento é efetuado da esquerda para a direita, batendo duas vezes o pé esquerdo de um lado e duas vezes o pé direito do outro, como corpo ligeiramente envergado e os braços caídos. Depois segue-se o canto das carreiras, improvisado pelos canturiôes sobre rimas sugeridas pelo pedreste. A carreira, que não é apresentada nas demonstrações públicas ou de palco, é entoada até que a rima fique esgotada. 

3) tipologia poética. Quando são de cunho religioso, têm lugar durante a licença ou no decorrer do canto da carreira — quando os canturiões se valem de trechos da Bíblia ou da História sagrada para demonstrarem sua superioridade diante dos adversários. Estes são obrigados às vezes a prosseguir a narração versificada, a partir do ponto em que os canturiões pararam. Essa forma, que hoje vai sendo abandonada, chama-se “cantar na Escritura”. De acordo com o tipo de rima, os versos podem ser simples, dobrados ou com duas dobras e dobrados duas vezes ou com três dobras: no cururu antigo eram cantados apenas versos simples, na forma A-B-C-B; já o moderno emprega os esquemas A-B-B-A ou, mais raramente, A-B-B-B-A. As carreiras (rimas) mais comuns são: a (a), abecê (ê), são joão (ão), sagrado (ado), dia (ia), cruz pesada (ada), divino (ino), presiunido (ido), santa catarina (ina) etc. A primeira carreira é sempre são joão, e a última, dia. Se antigamente os canturiões costumavam ficar improvisando durante longo tempo, principalmente nas carreiras mais fáceis, hoje cada um dos quatro já tem seu tempo de atuação delimitado. 

4) Características musicais. A música vocal do cururu, geralmente em falsete, apresenta dois aspectos: o canto silábico de introdução e encerramento, e o canto versificado das carreiras. O primeiro tipo chamava-se levante e hoje é conhecido como baixão; o segundo denomina-se maião. Conforme alguns informantes, maião é maneira de cantar, explicando-se assim o sentido da expressão “malão bem devagar”. Ambos os tipos de cantoria são conhecidos por toadas. Vale observar ainda que nem todos os cantadores empregam o canto silábico no encerramento. A música instrumental, antigamente executada por cotcho, adufe, reque-reque e puíta, hoje cabe apenas à viola de dez cordas ou cinco duplas, recoreco e pandeiro. E nas demonstrações públicas o único instrumento acompanhador é a viola. Esta pode ser ponteada ou rasqueada, quando não ponteada e rasqueada simultaneamente. Como a menor indecisão do violeiro pode prejudicar o cantador, este em geral costuma ter seu próprio instrumentista acompanhante. 

5) Época de realização e distribuição geográfica. Antigamente o cururu era mais comum durante as festas- do-divino e os festejos de São João. Hoje não tem datas fixas, servindo de pretexto para sua realização qualquer festa da coletividade ou de algum agrupamento social. Em São Paulo a dança tem seus principais centros nas cidades de Piracicaba, Laranjal Paulista, Conchas, Pereiras, Tatuí, Porto Feliz, Botucatu e Itapetininga. 

Fonte: Enciclopédia da Música Brasileira - Art Editora.

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